domingo, 24 de fevereiro de 2008

DEUS NO COTIDIANO


Não me conformava com a normalidade da minha relação com Deus. Nenhum fato extraordinário como uma carruagem de fogo, por exemplo. Nenhuma visão de anjo, santo, ou algo do gênero. Tudo era tão comum, que eu não me achava um homem de Deus. Nós somos assim. Criamos expectativas demasiadamente fantasiosas, anulamos a realidade, e nos sentimos no direito de nos decepcionarmos quando ela se sobrepõe. É preciso sonhar com os olhos abertos.
Sempre tive a certeza de que um dia, quando alcançasse um determinado grau de intimidade com Deus, minha relação pessoal com ele seria semelhante à de Moisés. Eu me isolaria, não num monte, mas no meu quarto mesmo. Lá eu ficaria horas absorto, estático. Depois, sairia com o rosto resplandeceste para enfrentar os problemas da vida. Eu não entendia as metáforas. Eu não tinha consciência que esse meu sonho “extravagante” de me relacionar com Deus era uma máscara. No fundo, eu queria apenas respostas para minhas dúvidas com essa “manifestação poderosa” do Senhor. Falta consciência prática para entender que o fim último da manifestação Divina não é saciar nossas dúvidas, mas nossa sede de amor. Eu queria do Senhor um grito para calar minhas perguntas. E ele me dava do Seu silêncio. Há silêncios que falam... Hoje acho que compreendo o que Sto. Agostinho quis dizer quando escreveu: “Respondei com clareza, mas nem todos Vos ouvem com a mesma lucidez. Todos Vos consultam sobre o que desejam, mas nem sempre ouvem o que querem.” (Confissões, Livro X, Cap. 26).
Somos tão racionais para lhe dar com a vida. Mas quando se trata da nossa relação com Deus, sempre queremos respostas que anulam a razão para que possamos crer. Queremos respostas capazes de abrir o mar do cotidiano. Mas penso que Deus quer que mergulhemos nesse mar. Há coisas em suas profundezas que precisamos conhecer.
Começo a entender que os homens de Deus não são apenas os capazes de vê-Lo na novidade do sobrenatural, mas os que sabem contemplá-Lo na normalidade do dia-a-dia.

sábado, 16 de fevereiro de 2008

O SÓCRATES DO PRESENTE



Um texto de Alexandre Raposo sobre a primeira matéria de um “foca” me fez repensar algo interessante: O jornalista é um socrático.
Digo isso, e sinto a necessidade de ir mais fundo na afirmação: se o jornalista não for socrático, ele precisa se tornar um.
Todos já ouvimos falar de Sócrates. O precursor da filosofia clássica. Aquele que acreditava ser um “parteiro” da verdade na medida em que ajudava os atenienses a colocarem para fora o conhecimento germinado em si. Aquele que interrogava as pessoas a fim de que encontrassem, por seu próprio bom senso, a verdade do que diziam crer e viver. É precisamente nessa característica que vejo a sinonímia entre Sócrates e o jornalista. Sua profissão é baseada na busca pela verdade dos fatos, aguçando (e não manipulando) o senso crítico da sociedade. E podemos perceber essa relação até no fato de que o homem não dispõe de todo o tempo pra refletir calmamente sobre os seus “por quês”, de modo que muitos passam a vida sem conseguir responder seu “lead” pessoal. O jornalista também tem disso em sua profissão. Buscar a verdade dos fatos, apurar informações, entrevistar pessoas, redigir o texto, correr para a redação, editar a matéria. Tudo isso implica numa corrida contra o tempo. O texto de Alexandre Raposo até cita o fato de a pauta dificultar a tarefa do jornalista (foca ou não) a não lhe fornecer todos os dados sobre a matéria a ser feita. O escritor alega que não haveria tempo suficiente para fazer um esqueleto completo da matéria. E é aí que entra o papel socrático do jornalista. É ele quem precisa fecundar o próprio pensamento em prol da sociedade, a fim de que ela possa parir a verdade, a notícia. Pode-se traduzir essa metáfora de fecundação, formação, e nascimento por preparação, apuração e redação. Mas tudo isso correndo contra o tempo.
Isso porque a escassez de tempo não quer dizer que a preparação da matéria a ser feita seja desnecessária. Pelo contrário, a capacidade de distinguir entre supérfluo e essencial se faz indispensável por que a matéria precisa ser entregue até o fim do expediente. Entra em cena a seleção de entrevistados, dos lugares visitados, etc. E essas decisões, quase que imediatas, não podem amputar nenhuma parte da matéria, e para isso, o jornalista tem de ser realmente um cirurgião, um parteiro.
É interessante o ponto de partida que o escritor (e o padrão jornalístico de entrevistas, de um modo geral) adota como base para uma boa matéria: a dúvida. O jornalista tem que sair para apuração com essa regra de Descartes em mente: Duvide de tudo. Da pauta, das fontes, da própria memória, etc.
E há uma explicação para que seja assim: os “filhos da pauta” correm o risco de perder a intuição se ficaram presos a ela. Além disso, tentar entender a pauta por si só é perigoso. Melhor seria falar com o editor. Usar a pauta do editor como referência para “sua” própria pauta.
Do mesmo modo, as fontes são referências rumo àquilo que se quer obter da pauta. O fato das fontes estarem disponíveis a dar entrevista não significa que elas estão dispostas a contar toda a verdade sobre os assuntos pertinentes à matéria. Daí a necessidade de entrevistar mais de uma fonte e ver cada entrevista como uma peça de quebra-cabeça.
E aí falamos da memória. Ela não reproduz na íntegra o que foi dito, ouvido, visto. A memória, em si, é uma edição de fatos vividos, cujo editor é o subconsciente. Confiar nela é perigoso. Então, anotemos tudo. Registremos o máximo possível de informações. Seja através de filmagens, de fotografias, de gravações, etc.
Depois de coletadas as informações, chega finalmente o momento de formar o corpo da matéria para o seu “nascimento”. Ordenar os dados obtidos, montá-los de forma concisa e coerente. Tudo isso é pensar de maneira filosófica diante das normas técnicas que devem ser atendidas para melhor compreensão do público alvo. É um processo trabalhoso. Mais do que isso, é um trabalho para o bem social e não individual. Por isso o paralelo com a filosofia socrática. A parteira não trabalha para o nascimento de seu filho, mas para o nascimento dos filhos de outras. Por isso creio que, se a primeira matéria é inesquecível, pode se tornar ainda mais na medida em que se compreende que ser jornalista é uma maneira de ser “filósofo do cotidiano”.

quarta-feira, 13 de fevereiro de 2008

Eneagrama

Foi a Gisele, uma amiga lá de Maringá, quem me apresentou o Eneagrama. Gostei dele. Ainda não posso dizer que somos amigos, mas ele me pareceu confiável. Disse pra mim que na classificação dos 9 tipos de persnolidades que ele faz, eu me enquadro no número 1: "o perfeccionista".
Vejam bem: eu disse perfeccionista, não "perfeito". Até mesmo porque é minha própria imperfeição que me faz ser assim. O Eneagrama me conhece bem. Sabe que sou mais exigente comigo mesmo do que qualquer outra pessoa pensa ser. Que as críticas dos outros é o que sempre espero. Que odeio ir pra casa com as pessoas batendo nas minhas costas e dizendo que fiz um bom serviço. Segundo o Eneagrama, eu não sei lhe dar com elogios. Sempre os acho muito falsos. Nunca acho que as coisas que faço ficam boas.
Acho até que os editores que trabalham comigo (e não só eles) se chegarem a ler isso serão tentados a dizer: "ainda bem que ele sabe o quanto é fraco!!!". E farão isso com a mesma razão que têm quando me corrigem.
Tudo pode ser melhor do que é. Tudo pode ser aperfeiçoado. E não me digam que é só o tempo que pode ajudar. Tempo não é andador de criança pequena. Ele apenas ajuda a lapidar a pedra bruta que está em nós. Mas não faz isso sozinho. Precisa do nosso empenho, do nosso perfeccionismo, da nossa dedicação.
O Eneagrama disse que esse perfeccionismo, quando em exagero, é perigoso. Pode se tornar uma espécie de utopia, algo que se busca sem conseguir achar. Mas, no momento, tenho mais medo da inércia do que da busca desenfreada!!

segunda-feira, 4 de fevereiro de 2008

Rascunhos!!!

Nem me venham com essa história de que sou pessimista. Prefiro a "alcunha" de realista. Apenas me alimento dos fatos. As expectativas são meros aperetivos, que ao invés de matarem a fome, abrem o apetite. Definitivamente, não as quero.
Acontece que tem pessoas (amigos, colegas) que torcem por mim. Tanto que elas próprias, por sua conta e risco, me contrataram como repórter da Rede Globo de Televisão. Mas os fatos não são esses.
Sou um jornalista recém-formado, chamado de "foca" pelos que são da área. Estou cobrindo férias numa afiliada da Globo, como um funcionário contratado provisoriamente por uma empresa terceirizada. Meu contrato começou a vigorar em dezembro de 2007 e termina no final desse mês. Depois "The End". Procurarei serviço. Em Londrina, Curitiba, até mesmo em Jacarezinho, se for o caso. Aprendi a não ter expectativas. Trabalho para aprender a ser últil. E por enquanto me acho longe disso. Mas a esperança existe. Esperança de que eu consiga, nesses dias que me restam lá, exercer um bom trabalho. Ser um bom profissional e uma boa pessoa. Que eu aprenda com os erros, que eu perceba minhas falhas e as evite com afinco. Que eu não perca de vista o lugar de onde eu vim pra alimentar o sonho de fazer com que minha mãe se orgulhe do filho que criou.
Enfim, meus caros: Fabiano é alguém em busca de seu espaço. É uma criança que ainda não anda sozinha, sem apoio. É a teimosia de querer ser melhor mesmo contra uma série de limitações. É assim (e só assim) que eu me vejo. A literatura machadiana diz que "o menino é o pai do homem". A minha realidade não tem o fascínio que é típico das histórias de sucesso. E o motivo é simples: a história está em andamento. O sucesso dela depende da minha competência em escrevê-la. Ainda estou rascunhando.

Rua Sem Nome

Jardim monte cristo. Zona leste de londrina. Por ali vivem muitos nordestinos que vieram para o paraná tentar uma vida melhor. Tudo começou com a construção de alguns barracos há mais de quinze anos. Hoje muitos deles já são casas.
O bairro possui muitas coisas que outros não tem e até lutam pra conseguir: rede de água, iluminação, asfalto... Mas o que falta também é essencial no dia-a-dia dos moradores.
Nos postes ou nas casas não há placas que indiquem o nome das ruas. A "nilson gonçalves siqueira" é conhecida como "rua dos pernambucanos". Mas não se trata de uma homenagem aos moradores. É que nem mesmo eles sabem o verdadeiro nome.
- "Seo jurandir, qual o nome da rua onde o senhor mora?", pergunto.
- "Não sei... é um nome tão esquisito que quando a gente precisa comprar alguma coisa tem que anotar num papel", responde jurandir da silva, que tem um bar na vila e adora criar pássaros.

O motorista clébson de souza explica como se localizam dentro do bairro:
- "a gente chama de rua 5, rua 6... e por aí vai".

Ali o correio não chega. dizem que o lugar não está mapeado. são os moradores que têm que se dirigir até as agências. o siate só chega quando alguém orienta a equipe desde a entrada do bairro.

- "conta de água e luz chega certinho. Isso eles não esquecem de entregar, não!", diz Clébson.

Os moradores que fazem compras no comércio no centro da cidade também não podem contar com a entrega em casa.

- " A gente tem que fretar um carro e trazer, por que eles não acham nossa casa. Acham até que a gente tá querendo dar um 'trambique'...", conta jurandir.